A política romana, particularmente nos períodos finais da República e nos séculos iniciais do Império, caracteriza-se por uma dinâmica de poder profundamente marcada por corrupção sistêmica, manipulação institucional e uma cultura política centrada na ambição pessoal e na competição violenta. Embora Roma tenha legado modelos institucionais duradouros ao pensamento ocidental, sua prática política cotidiana frequentemente se distanciava da norma legal, revelando um cenário de pragmatismo extremo e moralidade fluida.
Segundo Mary Beard (2015), “o Senado romano operava em grande medida por meio de conchavos e compromissos informais, muito mais do que por processos legislativos estruturados”. A República, embora teoricamente fundada sobre ideais de representação e equilíbrio de poderes, era dominada por uma oligarquia patrícia que utilizava o clientelismo e o patronato como principais instrumentos de mobilização política. O cursus honorum, a escada das magistraturas, era acessível apenas àqueles com vastos recursos financeiros e conexões familiares — e campanhas eleitorais muitas vezes envolviam subornos explícitos, espetáculos financiados privadamente e distribuição de alimentos.
Ronald Syme, em sua obra clássica The Roman Revolution (1939), argumenta que o colapso da República não foi causado por uma crise repentina, mas por um processo gradual de erosão institucional provocado por personalidades ambiciosas que instrumentalizaram o aparato estatal em prol de objetivos pessoais. Júlio César, Pompeu e Crasso, ao formarem o Primeiro Triunvirato (60 a.C.), estabeleceram um precedente de poder informal que minou a legalidade republicana. Para Syme, o surgimento do principado augustano representou uma reconfiguração autocrática do poder sob a fachada de continuidade republicana.
Durante o Império, a centralização do poder nas mãos do imperador não significou uma ruptura com a política sórdida da República, mas sua transformação em novas formas de dominação. A Guarda Pretoriana tornou-se um ator decisivo nas disputas palacianas, chegando a leiloar o trono a Dídio Juliano em 193 d.C., após o assassinato de Pertinax. T. P. Wiseman (2009) observa que, no ambiente imperial, a política migrou dos espaços públicos para os bastidores da corte, onde a intriga, a delação e o favorecimento definiam os rumos do poder. Imperadores como Calígula e Nero exemplificam o quanto a arbitrariedade pessoal podia comprometer a estabilidade política.
Apesar disso, o aparato jurídico e administrativo romano demonstrava notável capacidade de adaptação. Mary Beard destaca que, mesmo sob governos corruptos ou autoritários, havia uma expectativa social de respeito à tradição (mos maiorum) e às formas legais — ainda que muitas vezes apenas simbolicamente. Esse paradoxo entre legalidade formal e prática extralegal é uma das chaves para compreender a longevidade do sistema romano, apesar de sua profunda disfunção interna.
Em síntese, a política romana revela a tensão constante entre formas institucionais e práticas informais de poder. Estudar suas dinâmicas — como faz Syme ao analisar o uso estratégico da lealdade e do exército, ou Beard ao desvendar a performance retórica no Senado — permite não apenas entender o colapso da República e a natureza do Império, mas também refletir criticamente sobre os mecanismos universais de degeneração política nas sociedades complexas.
A política, desde os tempos da Roma Antiga, tem sido um palco de intrigas, ambições e manobras. A busca pelo poder, a utilização do sexo como ferramenta política, a traição e a manipulação são elementos que permeiam a história da política, tanto na Roma Antiga quanto no mundo contemporâneo. Este ensaio busca traçar paralelos entre as práticas políticas da civilização romana e as da atualidade, analisando como esses elementos se manifestam em diferentes contextos históricos.
Na Roma Antiga, a busca pelo poder era uma constante. Senadores, generais e imperadores disputavam o controle do Estado, utilizando todos os meios disponíveis para alcançar seus objetivos. Alianças, intrigas, subornos e até mesmo assassinatos eram comuns na política romana. A ambição pelo poder era tamanha que muitas vezes levava à violência e à guerra civil.
O presente artigo propõe uma análise comparativa entre as práticas políticas da Roma Antiga e os fenômenos observados na política brasileira contemporânea. Através de um enfoque temático que aborda a busca pelo poder, o uso do sexo como ferramenta política, e a traição e manipulação como estratégias de domínio, o artigo busca demonstrar como certos traços da imoralidade política romana permanecem presentes, ainda que em novas formas, nas estruturas democráticas modernas.
Desde o surgimento das primeiras organizações políticas complexas, a relação entre poder e moralidade tem sido ambígua. Roma, como civilização fundadora de muitos dos preceitos institucionais do Ocidente, legou não apenas modelos de direito e administração, mas também práticas de domínio marcadas pela corrupção, traição e manipulação. A presente discussão parte da hipótese de que, apesar das transformações institucionais e tecnológicas, certos aspectos do comportamento político romano persistem, ressignificados, na política contemporânea, particularmente na experiência brasileira.
A Busca pelo Poder: Ontem e Hoje
Na Roma Antiga, a busca pelo poder era incessante e brutal. Conforme Mary Beard (2015), a competição por cargos e honrarias transformava a política em um campo de batalha onde alianças temporárias, subornos e campanhas financiadas por fortunas pessoais eram a norma. A ascensão de figuras como César, Pompeu e Crasso ilustra como o poder era frequentemente alcançado à revelia da legalidade republicana, culminando em guerras civis e o colapso das instituições tradicionais (SYME, 1939).
No Brasil contemporâneo, a busca pelo poder também se manifesta de forma intensa. Partidos e lideranças articulam alianças políticas efêmeras, por vezes contraditórias ideologicamente, em nome da governabilidade. A corrupção estrutural, denunciada em diversos escândalos como o Mensalão e a Operação Lava Jato, revela a persistência de uma cultura de favorecimento pessoal e patrimonialismo. A utilização de fake news e métodos de manipulação midiática apenas reatualizam, com novos meios, antigas técnicas de dissimulação e controle.
O Sexo como Ferramenta Política
Na Roma Antiga, o sexo possuía valor estratégico. Imperadores utilizavam sua vida íntima como instrumento de alianças e de domínio. Casamentos eram arranjados para consolidar poder e evitar rebeliões. Figuras femininas como Lívia Drusa, esposa de Augusto, e Agripina, mãe de Nero, demonstram a influência política exercida pelos laços familiares e pela sexualidade no ambiente do palácio (WISEMAN, 2009).
No contexto atual, escândalos sexuais ainda comprometem carreiras e desestabilizam governos. A exploração da vida privada de figuras públicas, a exposição de relações extraconjugais e o uso de material íntimo como ferramenta de chantagem revelam a permanência da sexualidade como recurso político. A espetacularização da moral sexual, amplificada pelas redes sociais, reitera o caráter público do corpo político.
Traição e Manipulação como Estratégias de Poder
O assassinato de César, apunhalado por senadores que outrora o apoiavam, é talvez o mais simbólico ato de traição na história política romana. A lógica do "amigo de hoje, inimigo de amanhã" era intrínseca ao sistema republicano, onde alianças raramente ultrapassavam os interesses imediatos.
Na política brasileira, a traição também é recorrente. Mudanças abruptas de posicionamento, quebras de coligações e disputas internas entre aliados refletem a mesma dinâmica oportunista. A manipulação de discursos, o uso seletivo da informação e a propagação deliberada de fake news são evidências contemporâneas da instrumentalização da mentira como ferramental de domínio.
A análise comparativa entre Roma Antiga e o Brasil contemporâneo evidencia a permanência de padrões de comportamento político que transcendem as diferenças históricas e institucionais. A busca pelo poder, o uso do sexo como instrumento de influência, e a traição como estratégia de sobrevivência no jogo político são elementos que revelam uma continuidade na moralidade pragmática do poder.
No entanto, é preciso reconhecer que a política não se resume a seus aspectos mais sórdidos. Também é campo de disputa por justiça, representação e transformação social. A reflexão crítica sobre os paralelos com Roma nos serve como alerta: sem vigilância cidadã, educação política e fortalecimento institucional, os ciclos de imoralidade tendem a se repetir.
Referências Bibliográficas
BEARD, Mary. SPQR: Uma História da Roma Antiga. Rio de Janeiro: Record, 2015.
SYME, Ronald. The Roman Revolution. Oxford: Oxford University Press, 1939.
WISEMAN, T. P. The Myths of Rome. Exeter: University of Exeter Press, 2009.
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